
Síndrome de Guillain-Barré
A Síndrome de Guillain Barré (SGB) é uma doença auto-imune geralmente desencadeada após uma infecção viral ou bacteriana (ainda que também possa ocorrer após vacinação, cirurgia, anestesia epidural, transplante de órgãos e medula óssea, linfomas, sarcoidose e uso de penicilina), que provoca paralisia ascendente (dos pés até a cabeça) progressiva e potencialmente fatal.
Descrita inicialmente por Jean B. O. Landry em 1859, médico francês, como um distúrbio dos nervos periféricos que paralisava os membros, o pescoço e os músculos respiratórios. Em 1916, os médicos parisienses: Georges Guilliain, Jean Alexander Barre e André Strohl, demonstraram a anormalidade característica do aumento das proteínas com celularidade normal, que ocorria no líquor dos pacientes acometidos pela doença. Eis porque esta síndrome também é chamada de Landry-Guillain-Barré.
EPIDEMIOLOGIA
É uma doença cosmopolita de incidência anual entre 0,4 a 4 casos/100.000 habitantes (média de 1,3).Esta síndrome acomete todas as idades; no entanto, alguns estudos epidemiológicos mostram um pequeno pico na adolescência e adulto jovem, provavelmente devido ao maior risco de infecções.
Algumas séries mostram homens mais susceptíveis que as mulheres em torno de 1,25: 1.
Desde que se iniciou a vacinação contra poliomielite a SGB tornou-se a causa mais frequente de paralisia flácida aguda.
CAUSAS
A SGB é de provável etiologia auto-imune que pode ser desencadeada após 15 a 21 dias, em média, de uma infecção do trato gastro-intestinal ou trato respiratório.
Após o processo infeccioso o organismo produz anticorpos que agridem as bainhas de mielina de nervos perífericos e raízes nervosas. A mielina é a estrutura responsável por proteger (como uma capa) e permitir a transmissão do sinal nervoso ao longo de todo o trajeto do nervo.
Isto provoca fraqueza (paralisia flácida) e insensibilidade, que caracteristicamente progride de baixo para cima, em direção à cabeça, ascendente.
O agente mais comum encontrado como causador é o Campylobacter jejuni, que provoca infecção gastro-intestinal. Há também relatos de casos com Citomegalovirus, Epstein Barr vírus, Micoplasma pneumoneae.
Esta síndrome também é reconhecida como uma das complicações pela infecção pelo HIV, e também há relato de casos em decorrência de vacinação, cirurgia, anestesia epidural, transplante de órgãos e medula óssea, linfomas, sarcoidose e penicilina. Parece que a gravidez e uso de anticoncepcional oral conferem algum grau de proteção.
QUADRO CLÍNICO
Primeiramente é preciso esclarecer que a SGB não tratada leva rapidamente à morte, portanto, a constitui uma emergência médica, inclusive com indicação de tratamento em Unidade de Terapia Intensiva - UTI.
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Doença de instalação hiperaguda - horas ou dias.
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Sintomas mais frequentes: formigamentos e agulhadas nos pés; dores surdas nas costas; fraqueza muscular.
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Inicia-se com dores lombares associadas a desestesias nas extremidades inferiores.
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Com a profressão os membros inferiores ficam paréticos ou plégicos.
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Ocorre paraparesia motora e sensitiva (paralisia incompleta), paraplegia flácida, e arreflexia.
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Os reflexos tendinosos são perdidos precocemente, mesmo nas regiões onde a força muscular está preservada.
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O quadro progride de modo ascendente: dos pés para cabeça.
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50% dos casos pode acometer a face e função bulbar: disparesia parcial periférica, disfagia, disartria.
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30% dos casos: paralisia da musculatura respiratória.
Exame Físico:
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Paresia ou plegia
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Arreflexia
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flacidez simétrica
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Sensibilidade térmica e dolorosa preservadas.
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Sensibilidade vibratória e proprioceptiva comprometidas.
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Em pacientes graves: insuficiência ventilatória, disautonomias (arritmias cardíacas, sudorese, picos hipertensivos).
DIAGNÓSTICO
A SGB deve ser suspeitada em todos os pacientes com fraqueza motora ou déficit sensitivo não explicado afetando os membros. Os achados típicos no exame neurológico incluem fraqueza progressiva e ascendente e arreflexia tendinosa. É fundamental a pesquisa de infecções prévias.É imperativa a coleta do líquido cefalorraquidiano, que freqüentemente mostra dissociação albumino-citológica, ou seja, contagem celular normal com hiperproteinorraquia. Nos casos de pacientes com síndrome de imunodeficiência conseqüente ao HIV pode haver celularidade liquórica em torno de 10 a 50 células/ml.
Critérios para diagnóstico de SGB
1 - Achados necessários ao diagnóstico
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Diminuição de força progressiva em mais de um membro.
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Arreflexia tendinosa.
2 - Achados que reforçam o diagnóstico
a) Achados Clínicos
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Progressão.
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Simetria Relativa.
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Sinais e Sintomas discretos.
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Comprometimento de nervos cranianos: paralisia facial ocorre em 50% dos casos e freqüentemente são bilaterais.Pode acometer nervos responsáveis pela deglutição.
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Recuperação: começa geralmente de 2 a 4 semanas após parada da progressão.
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Disfunção Autonômica: taquicardia, hipotensão ortostática, sinais vasomotores.
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Ausência de febre no início dos sintomas.
b) Achados no líquido cefalorraquiano que dão forte apoio ao diagnóstico:
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Hiperproteinorraquia.
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Celularidade liquórica normal ou alta no máximo de 10 células mononucleares.
c) Achados que causam dúvidas quanto ao diagnóstico:
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Assimetria persistente e marcante da fraqueza.
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Disfunção vesical ou intestinal persistente.
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Mais de 50 células mononucleares no líquor.
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Presença de leucócitos polimorfonucleares no LCR.
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Nível sensitivo bem definido.
d) Achados que eliminam o diagnóstico:
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História de abusos de hexacarbonos.
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Metabolismo anormal das porfirias.
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Diagnóstico recente de difteria.
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Intoxicação pelo chumbo com neuropatia.
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Diagnóstico definido de poliomielite, botulismo, paralisia ou neuropatia tóxica.
SUBTIPOS CLÍNICOS DA SGB
Após o advento da eletroneuromiografia foi possível reconhecer e classificar 4 subtipos da SGB.É notório que a variante Miller-Fischer é um subtipo bem caracterizado clinicamente.
Polineuropatia desmielinizante inflamatória aguda (PIDA)
É a mais comum forma da SGB tendo uma incidência de 85 a 90% dos casos.Esta é considerada uma desordem auto-imune desencadeada por uma infecção prévia, geralmente por citomegalovirus e Epstein-Barr vírus.Na PIDA freqüentemente há comprometimento dos nervos cranianos, nervos sensitivos e há comprometimento autonômico.A recuperação é geralmente boa e a eletroneuromiografia mostra diminuição da velocidade de condução diminuída em 2 ou mais nervos motores.
Neuropatia axonal motora aguda (NAMA)
É outra forma da SGB, com incidência maior no Japão e China, geralmente devido infecção prévia pelo Campylobacter jejuni. O quadro clínico é semelhante a PIDA, porém raramente há comprometimento de nervos cranianos, nervos sensitivos, e raro comprometimento autonômico.A recuperação pode ser lenta ou rápida. A Eletroneuromiografia mostra degeneração axonal motora pura, com redução da amplitude dos potenciais de ação do nervo, sem desmielinização.A NAMA é freqüentemente associada a anticorpo anti-gangliosídeos (GM1, GM1b, GD1, Ga1NAc-GD1a).
Neuropatia axonal sensitivo-motora aguda (NASMA)
Tem baixa incidência, em torno de 10%, com comprometimento motor e sensitivo, detectado na eletroneuromiografia.
Síndrome de Miller-Fischer
É uma variante da SGB, caracterizada pela tríade arreflexia, ataxia e oftalmoplegia. Esta desordem é muita associada a anticorpos anti-gangliosídeo GQ1b.O diagnóstico dessa variante é eminentemente clínico e tem bom prognóstico.
TRATAMENTO
A pessoa acometida pela síndrome deve ser internada em UTI devido ao risco de arritmias e insuficiência respiratória.
O tratamento deve ser tanto de suporte como também específico.
TRATAMENTO DE SUPORTE
As principais complicações da SGB são a insuficiência respiratória e hipotensão. Cerca de 25 a 33% dos pacientes evoluem com insuficiência respiratória devida à falência diafragmática e necessitam de entubação orotraqueal e ventilação mecânica; porém este número pode diminuir com a instituição de medicação específica correta.A capacidade vital é o melhor parâmetro para indicação da entubação orotraqueal, quando esta estiver menor de 15mL/kg.
Outra complicação é a hipotensão postural que acomete 10% dos pacientes com SGB, devido à disautonomia, sendo tratado com infusão intravenosa de solução cristalóide e por agentes vasopressores.
TRATAMENTO ESPECÍFICO
Sabe-se, que a plasmaférese e a imunoglobulina (imoglobulina IV) são os tratamentos de escolha para SGB. No entanto, é imperativa a prescrição do tratamento até 2 semanas após o seu início, pois após não há efeito algum.
A droga de primeira escolha é a imunoglobulina 0,4g/kg por 5 dias, pois é menos invasiva que a plasmaférese e tem menos efeitos colaterais. A plasmaférese é feita com troca de plasma na fração de 50ml/kg de peso em 5 sessões separadas por 7-14 dias. A combinação da imunoglobulina e pasmaférese não trouxe vantagem significante.
O corticosteróide seja oral ou em pulsoterapia não é indicado, porém a associação com imunoglobulina pode ser promissor.
O futuro do tratamento está voltado para o beta-interferon, entretanto não há resultados suficientes que justifique o seu uso.
PROGNÓSTICO
O espectro clínico da síndrome de Guillain-Barré é muito amplo, isto é, varia desde a morte até a recuperação total.
A melhora clínica, eletrofisiológica e funcional acontece, geralmente, até 18 meses após o início da doença. A maioria das pessoas acometidas se recuperam em três meses após iniciados os sintomas. Portanto, as paralisias provocadas pela doença são reversíveis.
A necessidade de ventilação mecânica e a ausência de melhora funcional três semanas após a doença ter atingido o pico máximo são sinais de evolução mais grave.
BIBLIOGRAFIA
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Síndrome de Guillain-Barré. Universidade Federal Fluminense.
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Síndrome de Guillain-Barré. Medcenter.
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Síndrome de Guillain-Barré. Lookfordiagnosis.
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Síndrome de Guillain-Barré. Wikipédia.
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GRZESIUK, ANDERSON KUNTZ and SANTOS, LUIZ AUGUSTO DOS. Síndrome de Guillain-Barré associada a pancreatite aguda: relato de caso. Arq. Neuro-Psiquiatr. [online]. 1999, vol.57, n.3B [cited 2009-08-30], pp. 873-875.